Hoje autorizei um comentário de uma postagem que escrevi em 07/04/2008 : Xadrez é Cálculo.
Muito gratificante perceber que tem pessoas lendo as coisas antigas que escrevi.
Por isso, reproduzo abaixo a citada postagem. Foi a número 3 deste blog!!
3-XADREZ É CÁLCULO!!
A base do xadrez de competição é saber calcular. Acredito que esta habilidade e o conhecimento dos finais é o que garantem muitos pontos nos torneios. Cansei de ver jogadores "posicionais" (ou seja, que não calculam nada, o meu caso!) jogarem corretamente a abertura preparada, seguirem os planos de meio-jogo e, de repente, VAPO, toma um tático bonito (e nada difícil de ver) do adversário......perde a partida e profere, frustrado, a frase mais ouvida no xadrez: eu estava ganho!!!
Treinar cálculo não é somente matar problemas, aquelas belezuras de temas táticos (desvio, atração, descobertos,etc..) e motivos combinatórios (debilidade de fila, peça sobrecarregada,etc) bem definidos e com uma ou duas linhas apenas. Calcular não é apenas combinar. Evidente que quanto mais temas de combinação você dominar, melhor para seu cálculo, mas ficar só de matar problemas e combinações não dá ponto pra ninguém! conheço muitos jogadores "táticos" (na verdade, aqueles que não têm apego material e jogam "pra cima") que calculam mal paca! Na minha opinião, mais sintonizados com o treino de cálculo seria a solução de finais artísticos. Na verdade, estudar finais é um excelente exercício de cálculo!! sim senhores, é!! já estudaram finais de reis e peões? o que decide estes finais é o cálculo bruto, concreto!! estudar o Endgame Manual do Dvoretsky é matar dois coelhos chamados finais e cálculo com um estudo só!!!
Bom, senhores, calcular BEM no xadrez é difícil pra caramba! lembro agora do meu amigo Sadi Dumont. Quando lhe pergunto: "e aí, como vai o torneio?" ele sempre responde: "Mainha, ninguém calcula nada!!" Nem ele calcula (fogo amigo!)! há muitas dificuldades e motivos pelos quais se calcula mal (retornaremos a este tema muitas vêzes) mas uma das dificuldades principais é não reter as imagens calculadas na mente após um bom número de lances calculados.
Após um excelente ciclo de palestras sobre cálculo que assisti do emérito professor Luiz Loureiro, resolvi comprar uns livros dados na bibliografia. Estou lendo um que abordou esta dificuldade de focar as posições resultantes na mente. O livro é sensacional e algo antigo (1997), se chama Improve Your Chess Now, de um maluco chamado Jonathan Tisdall.
Tisdall propõe o método de analisar às cegas como um treinamento eficaz para focar as posições. Ele reproduz uma citação do grande Dr. Tarrasch: "Uma partida de xadrez é como um jogo às cegas. Por exemplo, toda combinação de cinco lances é executada mentalmente, com a única diferença que você tem um tabuleiro diante de si. As peças que você está olhando, frequentemente atrapalham seus cálculos!". Ele cita também o hábito de alguns top players (Shirov, Ivanchuk e Svidler) que frequentemente calculam variantes olhando para algum ponto do espaço fora do tabuleiro! Esses grandes jogadores claramente focam melhor suas visualizações de variantes críticas olhando para algum lugar que não seja o tabuleiro. Provavelmente esses super GM´s são tão confiantes nos seus poderes de visualização e cálculo que ao final de longas variantes eles prefiram checar suas conclusões sem ter a posição corrente no tabuleiro para distraí-los!!
Para aprimorar a capacidade de retenção das posições calculadas na mente, Tisdall cita o método Beliavsky. Entre torneios, Beliavsky costumava reproduzir e analisar por dia pelo menos cinco partidas às cegas. Mas até chegar neste estágio é uma distância e tanto e não sei até que ponto produtivo para quem não é GM. O negócio é seguir o método de Beliavsky, começando por partidas curtas, visualizando gradativamente posições mais complicadas (esse método é aplicado pelo GM Darcy Lima a seus alunos). Nesse treino, Tisdall recomenda uma técnica: "Stepping- Stone" que simplesmente consiste em "resetar" a posição no ponto em que você começa a perder o foco. Reinicie os cálculos (peças movidas? visualize-as em suas novas casas. Peças trocadas? remova-as da sua mente) a partir da posição "resetada".
Vamos à prática! vou dar 4 exemplos de partidas que vocês devem reproduzir mentalmente (não olhem para um tabuleiro) até um ponto onde deverão responder com lances a um questionamento. Ou seja, trabalho mental é requerido após uma posição estar registrada na mente (focada). Vamos lá (dou a notação algébrica extensa para facilitar!):
Sokolov x Savko-1994
1.c2-c4 Cg8-f6 2.Cb1-c3 e7-e5 3.g2-g3 d7-d5 4.c4xd5 Cf6xd5 5.Bf1-g2 Cd5-b6 6.Cg1-f3 Cb8-c6 7.0-0 Bf8-e7 8.a2-a3 0-0 9.b2-b4 Bc8-e6 10.d2-d3 a7-a5 11.b4-b5 Cc6-d4 12.Ta1-b1 f7-f6 13.Cf3-d2 Cb6-d5 * O QUE ACONTECE AGORA?
Chachalev x Ayupbergenov-1994
1.e2-e4 Cg8-f6 2.e4-e5 Cf6-d5 3.d2-d4 d7-d6 4.Cg1-f3 d6xe5 5.Cf3xe5 g7-g6 6.Bf1-c4 c7-c6 7.Dd1-f3 Bc8-e6 8.Cb1-c3 Cb8-d7 9.0-0 Bf8-g7 10.Tf1-e1 0-0 11.Bc1-d2 Cd7xe5 12.d4xe5 *
O QUE ACONTECE AGORA?
Svidler x Malaniuk-1994
1.e2-e4 e7-e5 2.Cg1-f3 Cb8-c6 3.d2-d4 e5xd4 4.Cf3xd4 Cg8-f6 5.Cb1-c3 Bf8-b4 6.Cd4xc6 b7xc6 7.Bf1-d3 d7-d5 8.e4xd5 c6xd5 9.0-0 0-0 10.Bc1-g5 c7-c6 11.Cc3-a4 h7-h6 12.Bg5-h4 Tf8-e8 13.c2-c4 Bb4-d6 14.c4xd5 c6xd5 15.Ca4-c3 Bd6-e5 16.Cc3xd5 * O QUE ACONTECE AGORA? QUAL FOI A IDÉIA DO ÚLTIMO LANCE DAS BRANCAS?
Gaertner x Wohlfarht-1994
1.d2-d4 Cg8-f6 2.c2-c4 g7-g6 3.Cb1-c3 Bf8-g7 4.e2-e4 d7-d6 5.h2-h3 0-0 6.Bc1-e3 Cb8-a6 7.Bf1-d3 e7-e5 8.d4-d5 Cf6-h5 9.Cg1-e2 f7-f5 10.e4xf5 g6xf5 11.g2-g4 e5-e4 12.g4xh5 e4xd3 13.Dd1xd3 f5-f4 14.Be3-d4 Ca6-b4 15.Dd3-d2 Bg7xd4 16.Ce2xd4 Dd8-f6 17.0-0-0 Bc8-d7 18.Cc3-e4 Df6-e5 * O QUE ACONTECE AGORA?
NÃO ESQUEÇAM, DEVEM REPRODUZIR ÀS CEGAS, SEM OLHAR O TABULEIRO!
Honestidade intelectual e ética (tenho visto exemplos tristes de falta de ética nos tabuleiros) são fundamentais no bom desenvolvimento pessoal.
Bom, sou um aprendiz. Dêem feedback deste post com comentários, sugestões, discordâncias,etc.
Obrigado, até o próximo post!